Por Natália Scanferla
A usucapião consiste na aquisição da propriedade por meio do exercício contínuo e ininterrupto da posse durante um período determinado tempo.
Os requisitos essenciais para a configuração da usucapião são, em síntese, o exercício da posse e a intenção de exercer os direitos de propriedade como se fosse o legítimo proprietário.
Trata-se de uma forma originária de aquisição da propriedade, o que significa que, ao ser concedida, ela pode sanar quaisquer vícios preexistentes e eliminar quaisquer ônus que eventualmente recaiam sobre o imóvel (encargos, dívidas ou restrições).
Diferentemente da adjudicação compulsória, que se fundamenta em um negócio jurídico prévio, a usucapião baseia-se exclusivamente na posse contínua e incontestada do bem, independentemente da existência de promessa de compra e venda.
Contudo, tanto a adjudicação compulsória quanto a usucapião possuem a finalidade de regularizar a propriedade perante o registro de imóveis, sendo que ambas podem ser requeridas de forma extrajudicial, desde que observadas as disposições do Provimento nº 149/2019 do CNJ.
O processo de desjudicialização desses institutos visa simplificar os procedimentos, buscando evitar a intervenção do poder judiciário em casos nos quais não há oposição ao pedido.
Para a usucapião, é necessário apresentar: planta e memorial descritivo; anuência dos confrontantes e do proprietário tabular; prova da posse; notificação dos entes federados; e publicação de editais.
No caso da adjudicação compulsória, são exigidos: negócio jurídico prévio; comprovação do adimplemento das obrigações; comprovação do inadimplemento das obrigações por parte do promitente vendedor; e o pagamento do imposto de transmissão.
Não obstante o fato de possuírem a mesma finalidade, é importante salientar que a usucapião deve ser considerada uma medida excepcional, com o intuito de prevenir fraudes e práticas que busquem elidir o pagamento dos tributos incidentes sobre a eventual transferência da propriedade, conforme o artigo 410, §2º, do Provimento nº 149 do CNJ.
Seguindo o mesmo raciocínio, o artigo 13, § 2º, do Provimento nº 65 do CNJ, que trata especificamente da usucapião extrajudicial, também dispõe que é imprescindível a existência de justa causa, ou seja, um impedimento à transferência por meios convencionais, para a aplicação da usucapião.
Mas não só a questão tributária justifica a aplicação da usucapião em último caso. Isso ocorre porque a usucapião pode ter efeitos mais amplos, uma vez que, com o deferimento do instituto, as dívidas ou encargos sobre o imóvel são extintos, o que impacta eventuais credores com interesse nessas obrigações.
De forma semelhante, no âmbito judicial, tem-se evidenciado a necessidade de demonstração da existência de um obstáculo à transferência do bem pelos meios convencionais, a fim de justificar a aplicação da usucapião. Ou seja, os tribunais pátrios também têm entendido a usucapião como uma medida excepcional.
Assim, é de extrema importância que o advogado dos envolvidos observe o instituto aplicável ao caso em análise, a fim de evitar, ao ajuizar a ação de usucapião, o indeferimento do pedido por inadequação da via eleita na esfera extrajudicial ou a extinção do processo por falta de interesse de agir na esfera judicial.
A análise criteriosa do caso, aliada à observância das normativas do CNJ, é essencial para garantir a validade e eficácia do procedimento, assegurando segurança jurídica tanto para os promitentes vendedores quanto para os adquirentes.
Conclui-se, portanto, que a usucapião extrajudicial, embora se configure como uma ferramenta eficaz para a regularização da propriedade, deve ser manejada com cautela, especialmente no que se refere à exigência da justa causa para sua utilização.